Cooperativa de manejo florestal comunitário estimula a geração de renda

Organização opera na maior unidade de conservação de uso sustentável do Brasil e conseguiu quitar empréstimo bancário antecipadamente

Nesse mês de maio de 2020 a Cooperativa Mista Agroextrativista Nossa Senhora do Perpétuo Socorro do Rio Arimum (Coomnspra) conseguiu quitar o crédito bancário para custeio da exploração sustentável da madeira na Reserva Extrativista Verde para Sempre para o ano de 2019, fato que indica viabilidade das operações de manejo florestal comunitário e familiar (MFCF) e o compromisso dos comunitários com o agente financeiro que concedeu o financiamento.

Credibilidade

Com o prazo de dois anos para ser quitado, o crédito foi viabilizado pelo Programa de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf) e operado pelo Banco da Amazônia (Basa). Originalmente os juros pelo empréstimo era de 3% ao ano, contudo a cooperativa honrou o compromisso antes do prazo, economizando 1% de juros do valor original.

Embora o repasse tenha sido individual o recurso foi gerenciado pela Cooperativa, fato que tornou a responsabilidade pelo pagamento do crédito uma ação da coletividade. O pagamento foi efetivado em menos de um ano, honrando os 22 contratos individuais que somavam R$ 470 mil.

“O arranjo pensado para empréstimo favoreceu esse pagamento. O repasse foi para os cooperados, porém assumimos, enquanto organização, a gestão financeira dos recursos recebidos. Eles foram fundamentais para que a cooperativa conseguisse negociar melhores condições de pagamento com o comprador da safra, bem como garantir o pagamento em dia da mão-de-obra dos cooperados”, comenta Jones Santos, presidente Coomnspra.

Com o crédito foi possível viabilizar também pagamentos à vista e com melhores preços dos insumos e aluguel de maquinários para as operações da safra, conforme previsto no plano do empréstimo. “Isso fez com que a cooperativa, desde sua criação em 2014, fechasse pela primeira vez o ano fiscal com saldo positivo em nossa contabilidade. Foi possível investir em equipamentos e bens para melhorar a produção. Vamos poder também dividir as sobras com a comunidade”, ressaltou a tesoureira da Coomnspra, Nilde Ribeiro.

Os empréstimos na modalidade concedida à Cooperativa em Porto de Moz sempre trazem consigo o risco da inadimplência, ou seja, a incapacidade de pagamento do tomador do empréstimo, afirma Flávia Castro, supervisora de análise do PRONAF do Basa. “O risco no Pronaf operado pelo Basa está em torno de 5,92%. Ao honrar o compromisso financeiro, a cooperativa ganha credibilidade junto ao agente financeiro”, explica.

Articulação

O custeio da safra florestal operado na Resex Verde para Sempre só foi possível graças à ação articulada de diversos parceiros que somaram esforços para que o crédito se tornasse uma realidade. Estiveram envolvidos nesse trabalho a diretoria das cooperativas e associações da Resex Vede para Sempre, organizações de apoio técnico que atuam no território, tais como, o Instituto Internacional de Educação do Brasil (IEB), Instituto Conexões Sustentáveis (Conexsus), Instituto Floresta Tropical (IFT), Embrapa Amazônia Oriental através do Projeto Bom Manejo 2 e o Comitê de Desenvolvimento Sustentável de Porto de Moz (CDS).

A articulação provida pelo Observatório do Manejo Florestal Comunitário e Familiar (OMFCF), representado pelas organizações que atuam na Resex Verde para Sempre, conseguiu o apoio da Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural (Emater) para a emissão das Declarações de Aptidão ao Pronaf (DAPs) e dos projetos de crédito que foram apresentados ao Basa.

“Somente após diversas reuniões realizadas pelos parceiros com o banco, foi possível definir condições mais favoráveis às organizações comunitárias, tais como a gestão coletiva do recurso pela cooperativa, o aumento da carência para 2 anos, taxa de juros de 3% ao ano e, o principal: o plano de manejo florestal sustentável como garantia do empréstimo” explica a coordenadora do IEB, Katiuscia Miranda.

João Luiz Guadagnin, membro do Conexsus, avalia que o trabalho de parceria dos cooperados e direção da Coomnspra, juntamente com as outras organizações envolvidas na articulação da concessão do crédito, foi o diferencial para que o primeiro financiamento de custeio para o MFCF atingisse dois objetivos:  estimular a geração de renda e melhorar o uso da mão de obra familiar – ambos também são foco do crédito rural do Pronaf

“O uso coletivo dos recursos, sob coordenação da Coomnspra, assegurou 100% de adimplência, o que comprova que é um modelo que pode ser replicado com outras organizações econômicas socioambientais da Amazônia. A devolução dos recursos antes do prazo definido no contrato serve para aumentar a confiança dos agentes financeiros nos extrativistas e em suas organizações”, afirma João Guadagnin.

Maturidade gerencial

“O que vemos aqui é o surgimento muito promissor de um novo modelo de financiamento do uso sustentável das florestas no Pará e na Amazônia”, comenta o pesquisador Maximilian Steinbrenner, do Projeto Bom Manejo 2 (Embrapa). Para ele a operação de crédito na Verde Para sempre foi bem-sucedida e registra a maturidade gerencial da cooperativa, conquistada com entusiasmo e persistência.

“A COOMSPRA domina as questões técnicas do manejo florestal sustentável há bastante tempo. Operar um crédito dessa categoria de maneira profissional representa um novo marco em sua história, principalmente em meio a uma crise econômica causada por uma pandemia”, conclui Steinbrenner.

A extrativista Rosalina Magalhães é a segunda secretária da Coomnspra e foi uma das comunitárias que recebeu o crédito. Envolvida na diretoria da cooperativa ela avalia que o feito favorece novas oportunidades na Resex. “Foi uma boa experiência, mostrou que temos capacidade de gerenciar o crédito bancário. Podemos conseguir outros [créditos], não só para a madeira, mas para a agricultura e para nossas associações”, ressalta.

Em tempo

A Coomnspra é uma das seis organizações comunitárias com planos de manejo ativos na Reserva Extrativista Verde para Sempre – a maior do Brasil, com mais 1,2 milhão de hectares. A cooperativa é pioneira no MFCF dentro de Unidades de Conservação no país, tendo obtido em 2016 a certificação FSC.

Com a pandemia mais de 200 famílias na Resex Verde para Sempre pararam as atividades ligadas à extração sustentável de madeira. Estimativas feitas pelo Observatório do Manejo Florestal Comunitário e Familiar (OMFCF) indicam um prejuízo de cerca de R$ 1,3 milhão caso as comunidades não consigam operacionalizar a safra de 2020 por conta das paralisações

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